"Sou uma mulher madura
Que às vezes anda de balanço
Sou uma criança insegura
Que às vezes usa salto alto
Sou uma mulher que balança
Sou uma criança que atura"
Martha Medeiros
domingo, 21 de março de 2010
"Todo homem que a gente vê andando por aí saiu de um ventre feminino. Nós somos seres que geram crianças do nada. Sem fazer esforço, sai das nossas barrigas uma criatura com dedos, rins, pulmão, sangue, coração, tudo funcionando. Esse poder nos confere uma dimensão divina. Nós somos misteriosas, mais introspectivas, somos complexas e contraditórias, e nascemos sabendo amar incondicionalmente. Tudo isso é muito esquisito para eles. Acho que o homem está muito assustado com a nova mulher perigosamente solta, perigosamente livre, perigosamente sexualizada e interessada em si mesma e não servindo mais àquele ponto de referência estável a que ele estava acostumado "
(Maitê Proenca)
sexta-feira, 5 de março de 2010
Meu coração está aos pulos! Quantas vezes minha esperança será posta à prova? Por quantas provas terá ela que passar? Tudo isso que está aí no ar: malas, cuecas que voam entupidas de dinheiro, do meu dinheiro, do nosso dinheiro que reservamos duramente pra educar os meninos mais pobres que nós, pra cuidar gratuitamente da saúde deles e dos seus pais. Esse dinheiro viaja na bagagem da impunidade e eu não posso mais. Quantas vezes, meu amigo, meu rapaz, minha confiança vai ser posta à prova? Quantas vezes minha esperança vai esperar no cais? É certo que tempos difíceis existem pra aperfeiçoar o aprendiz, mas não é certo que a mentira dos maus brasileiros venha quebrar no nosso nariz. Meu coração tá no escuro. A luz é simples, regada ao conselho simples de meu pai, minha mãe, minha avó e os justos que os precederam: " - Não roubarás!" " - Devolva o lápis do coleguinha!" " - Esse apontador não é seu, minha filha!" Ao invés disso, tanta coisa nojenta e torpe tenho tido que escutar. Até habeas-corpus preventivo, coisa da qual nunca tinha visto falar, e sobre o qual minha pobre lógica ainda insiste: esse é o tipo de benefício que só ao culpado interessará. Pois bem, se mexeram comigo, com a velha e fiel fé do meu povo sofrido, então agora eu vou sacanear: mais honesta ainda eu vou ficar. Só de sacanagem! Dirão: “ - Deixa de ser boba, desde Cabral que aqui todo o mundo rouba.” E eu vou dizer: ”- Não importa! Será esse o meu carnaval. Vou confiar mais e outra vez. Eu, meu irmão, meu filho e meus amigos. Vamos pagar limpo a quem a gente deve e receber limpo do nosso freguês. Com o tempo a gente consegue ser livre, ético e o escambau.” Dirão: " - É inútil, todo o mundo aqui é corrupto, desde o primeiro homem que veio de Portugal”. E eu direi: ” - Não admito! Minha esperança é imortal!” E eu repito, ouviram? IMORTAL!!! Sei que não dá pra mudar o começo, mas, se a gente quiser, vai dar pra mudar o final.
( Só de Sacanagem- Elisa Lucinda)
Houve um tempo em que minha janela se abria sobre uma cidade que parecia ser feita de giz. Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco. Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre com um balde e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas. Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz. Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crinças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como refelectidas no espelho do ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. Às vezes um galo canta. Às vezes um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. E eu me sinto completamente feliz. Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.